Os olhos tranquilos e o sorriso alegre de Marivalda Kariri guardam a
cantora de sucesso, que outrora conquistava o Brasil com a canção “Toco
cru e sua estória”. Hoje, Marivalda usa o cenário do Sertão Central, tão
flagelado pela seca, para transformar a realidade de jovens por meio da
arte e preservação da cultura sertaneja.
No município de Milhã, localizado a 301 km da capital cearense,
Marivalda coordena a Associação Cultural Hugo Pinheiro, que atende 70
jovens da região. Marivalda assumiu a administração em 2009. Neste
período, a cantora aumentou as atividades ofertadas pelo projeto, com a
criação do Museu e da Casa de Cultura.
O museu foi construído na casa que pertencia à tataravó da cantora,
restaurada para abrigar o acervo adquirido ao longo dos anos. Segundo
ela, a construção representa um importante resgate histórico. “Lá dentro
está o pilão, o moinho, os potes d`água, a chaleira de ferro, aquelas
coisas que são bem antigas”. O museu também tem peças de arte sacra e
2.500 discos de vinil de diversos ritmos, desde o forró pé-de-serra até
os clássicos do rock. A cantora diz que pretende fazer um convênio com
faculdades do Ceará, de modo a abrir o museu para pesquisas.
A Casa de Cultura forma grupos de atores e coral em dois núcleos, um
deles voltado a jovens afrodescendentes. Além dos cursos de canto e
teatro, Marivalda adianta que a associação também ofertará aulas de
audiovisual e fotografia, em agosto próximo.
O mais recente projeto desenvolvido pela Associação Cultural Hugo
Pinheiro é o documentário sobre a história de Marivalda Kariri, Messias
Holanda, Pedro Bandeira e Zé Manu. “Nós nos consideramos um patrimônio
vivo da cultura cearense. Somos os últimos remanescentes do forró
pé-de-serra no Ceará”. A produção é dirigida pelos quatro artistas e
conta com trabalho do diretor fotográfico Alex Meira.
A Forrozeira da Amazônia
Marivalda Kariri começou cedo sua carreira artística. Aos oito anos já
dava os primeiros passos como cantora no coral da Igreja em Milhã. Com a
morte da mãe, morou em um orfanato em Recife onde participou do coral
infanto-juvenil até os 14 anos. “Tive muita dificuldade na infância e na
adolescência, é uma história meio triste, mas hoje faço dessa história
um aprendizado”. Em uma das apresentações na Igreja do orfanato,
Marivalda cantou na quermesse para a coroação de Nossa Senhora, que
também teve a participação de Jackson do Pandeiro - então, O Rei do
Ritmo.
Segundo a cantora, no momento em que Jackson a ouviu cantar, quis
conhecer a dona da voz “de gente grande” e, em seguida, convenceu a
freira a deixá-la subir no caminhão para cantarem juntos. “Foi uma coisa
providencial para mim, eu diria que foi meu passaporte para eu ser o
que eu sou”. Marivalda considera Jackson seu padrinho no campo artístico
e até hoje guarda as palavras do cantor, servindo de motivação para que
sempre buscasse seu sonho: “Você perdeu sua mãe, mas Deus te deu seu
gogó. Vá para o mundo, vá cantar, vá viver dele”.
A cantora conta que pouco viveu em Milhã e quando retornou, seu pai
queria que ela se casasse contra sua vontade. Incentivada pelo irmão,
pretendia fugir e seguir com a carreira. Mas o casamento a segurou. “A
pessoa com quem eu casei era de família boa”, explica. Durante quatro
anos, o casal morou numa uma roça distante, em Quixeramobim. Durante
esse período, ela juntou dinheiro com a criação de galinhas e ovelhas,
possibilitando que se mudasse para Fortaleza com os filhos.
De Fortaleza, Marivalda foi para São Paulo, onde deu início à sua
carreira como cantora profissional. Embora já cantasse em forrós e
casamentos, foi nessa nova fase que surgiu a oportunidade de gravar
discos.
Outro lugar marcante para a cantora foi a Amazônia. “Foi onde eu fiz o
meu pé de meia, me estruturei, criei minha economia financeira. Era uma
vida difícil, mas eu sabia que dali eu ia tirar o sustento dos meus
filhos e o meu”. Para Marivalda, a Amazônia era uma mina, pois os
cantores eram muito bem pagos e ela tinha a preferência dos
contratantes. Neste período, a cantora também trabalhou com Luiz
Gonzaga.
Ao longo da carreira, foram 28 discos lançados. O maior sucesso foi a
música “Toco cru pegando fogo”. Lançada durante a ditadura, a canção foi
censurada por conta do refrão e fala sobre Rondônia e os povos que
habitavam a Amazônia, os quais eram atingidos pelas queimadas. A
inspiração da música veio quando Marivalda sobrevoava os garimpos.
Quem
ENTENDA A NOTÍCIA
Marivalda Kariri tem mais de cinco décadas de carreira. Foi uma das
primeiras cantoras de forró a veicular a malícia e o humor em suas
músicas. Seu maior sucesso foi “Toco cru pegando fogo”. Entre discos de
vinil e CDs já gravou 28 álbuns.
Fonte Jornal O Povo
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